O escritor guineense Tony Tcheka afirmou na sexta-feira, em Cabo Verde, que Amílcar Cabral não está presente na Guiné-Bissau, o país que ajudou a libertar e onde quem defende o líder africano é “um alvo a abater”.
“Depois de tudo o que passámos, desta longa caminhada, tanta solidariedade, tantas mortes. Como é possível chegarmos onde chegámos”, disse o poeta durante uma mesa redonda em homenagem ao centenário do nascimento de Amílcar Cabral, na capital cabo-verdiana.
O evento faz parte do XII Encontro de Escritores de Língua Portuguesa, organizado pela União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa (UCCLA) e pela Câmara Municipal da Praia e que decorre na capital de Cabo Verde até domingo.
Num discurso emocionado, e ao qual assistiram vários escritores lusófonos e o presidente da Fundação Amílcar Cabral e antigo companheiro da luta de libertação, Pedro Pires, o escritor criticou “os que hoje tentam denegrir toda uma jornada libertadora, que teve repercussões em outros países africanos, além de Cabo Verde e da Guiné-Bissau”.
Esta posição, explicou, “revela a cobardia dos que se opõem à sociedade projetada” por Cabral, os mesmos que “não querem que a Guiné-Bissau tenha acesso ao conhecimento”.
“Cabral não está presente na Guiné-Bissau, é proibido”, afirmou.
E prosseguiu: “Eles têm medo de Cabral, da verdade, de estarmos bem; têm medo de que o guineense tenha acesso ao conhecimento e que esteja bem, sem estender a mão”.
“Há muitos companheiros, amigos nossos, de mão estendida. É trágico. Cabral não está. Cabral é combatido na Guiné-Bissau”, disse.
Recordando que “Cabral foi defensor da criança”, o também jornalista disse que, hoje, quando uma criança guineense precisa de ir ao hospital, porque está doente, tem febre, a primeira pergunta que quem a leva ouve é quem vai pagar a despesa.
“Não há gesso, uma chapa para a radiografia, medicamentos, medicamento para a malária, mas há tanto dinheiro para comprar material bélico, armas, batalhões altamente armados”, lamentou, prosseguindo: “O índice de mortalidade infantil sobe de forma galopante, as mulheres morrem na hora do parto, os recém-nascidos acabam por morrer por falta de assistência médica. O dinheiro é só para atividades belicistas”.
Para Tony Tcheka, por estas razões é que “cada vez há mais guineenses a saírem e a quererem sair”, apesar de a Guiné-Bissau não ser “um país de emigrantes”.
“Hoje, onde quer que se chegue, nos sítios mais inimagináveis, tantos guineenses, tantos jovens, tanta capacidade, tanta força de trabalho”, pessoas que fogem da fome e de “situações deploráveis”.
“Na hora em que evocamos Cabral, temos de ter essa coragem de dizer, falar da verdade, o que nos vai na alma, no nosso coração, na nossa forma de estar”, disse, questionando: “Porque não querem que pensemos? Odeiam o pensamento”.
As palavras de Tony Tcheka foram proferidas durante uma mesa redonda moderada pela escritora cabo-verdiana Cheila Delgado, em que participaram os escritores José Luiz Tavares e Nardi Sousa (Cabo Verde) e Luís Carlos Patraquim (Moçambique).
Os escritores Luís Cardoso (Timor), Augusta Teixeira (Cabo Verde) e José Pires Laranjeira (Portugal) participaram no painel seguinte deste encontro que tem como tema geral “Literatura, liberdade, inclusão”.
A Semana com Lusa
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