O mundo precisa de voltar a estudar História e Filosofia para evitar erros passados e ler Amílcar Cabral, disse Iva, filha mais velha, no ano do centenário do líder das independências de Cabo Verde e Guiné-Bissau.
Espera que não haja uma guerra mundial, mas acredita que o mundo tem um caminho difícil pela frente, até melhorar: “Tenho esperança que o meu neto nasça já num ambiente menos belicoso e menos horroroso”.
Neste contexto, a obra de Cabral pode ser utilizada “para pôr um pouco de seriedade nas coisas. Ele é muito atual”, disse.
“Pensar com as nossas cabeças” é um dos seus princípios mais citados – de especial significado anticolonial – e que Iva destaca a par de outra ideia: “Unidade e luta. Acho fundamental, principalmente na Guiné-Bissau”, onde nasceu e que ainda procura estabilidade política e desenvolvimento, 51 anos após a independência.
“Não é só em Cabo Verde, é no mundo. Pôs-se a História de lado e agora a História está a dar-nos bofetadas e a mostrar que é fundamental conhecê-la para não cometer os mesmos erros”, referiu a historiadora de 71 anos, em entrevista à Lusa.
Quais erros? “É só abrir a rádio e uma pessoa fica na Segunda Guerra Mundial, às vezes, até na Primeira”, responde, face à guerra na Ucrânia, à prevalência de Trump nos Estados Unidos depois de condenado, a Macron “que se acha Napoleão” ou à ofensiva de Israel em resposta ao Hamas.
“Sinto vergonha de ser humana quando deixamos uma coisa dessas acontecer e ninguém diz nada”, acrescentou, face ao número de mortes e vítimas na Faixa de Gaza.
“Estamos numa situação em que a História está a mostrar que existe e que é séria”, depois de “há uns 20 anos” o ensino ter mudado.
“O ensino das ciências sociais quase desapareceu. O que é que nós damos? Informática, gestão, economia. [Ciências] humanísticas estão postas de parte”, disse Iva Cabral, que já foi reitora em Cabo Verde.
As novas áreas de formação “dão dinheiro”, mas não são tão férteis a dar ideias, pelo menos não como História ou Filosofia, disciplinas que acha que fazem muita falta aos políticos.
“Uma pessoa olha para o nível dos chefes da União Europeia e dá vontade de chorar. Já não falo de África, porque estamos mais ou menos acostumados. Não sei como é que chegámos ao ponto de ter governantes tão medíocres” a nível global.
“Cada um é pior que o outro. Onde estão Miterrand, Giscard [D’Estaign] ou Mário Soares, onde estão eles?”, questionou, evocando antigos estadistas franceses e de Portugal e apontando para um vazio de exemplos, “muito por causa do ensino que houve. Tenho a certeza, é muito por causa do ensino. Se for ver, esses meninos todos que estão a governar-nos, de onde é que eles saíram? Falta cultura. Faltam ciências sociais”.
Para Iva, este não é um problema de ideologias, não tem a ver com estar à esquerda ou à direita, “mas com conhecimento”, com consciência da “dignidade humana, sabendo o que é”.
Espera que não haja uma guerra mundial, mas acredita que o mundo tem um caminho difícil pela frente, até melhorar: “Tenho esperança que o meu neto nasça já num ambiente menos belicoso e menos horroroso”.
Neste contexto, a obra de Cabral pode ser utilizada “para pôr um pouco de seriedade nas coisas. Ele é muito atual”, disse.
“Pensar com as nossas cabeças” é um dos seus princípios mais citados – de especial significado anticolonial – e que Iva destaca a par de outra ideia: “Unidade e luta. Acho fundamental, principalmente na Guiné-Bissau”, onde nasceu e que ainda procura estabilidade política e desenvolvimento, 51 anos após a independência.
“A realidade é que, quanto mais se estuda, mais se encontra” e o reconhecimento global de Amílcar Cabral prova a pertinência da sua ação, que deixou registada – como nas comunicações do seminário de quadros de 1969, em Conacry (onde o Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde, PAIGC, tinha base), escritos publicados pela Fundação Amílcar Cabral.
“E há ações em Portugal e noutros países que me orgulham muito”.
“Gostaria que houvesse mais apoio dos Estados para que os currículos escolares em Cabo Verde e na Guiné-Bissau falassem de Cabral, da luta de libertação e dos antigos combatentes com mais amplitude”, referiu, reiterando uma sugestão que já faz há muitos anos.
Só que os Governos passam e nada muda, lamentou, sendo que “há formas de falar sobre isso de maneira a que as crianças compreendam. As ditas grandes nações começam a falar dos seus heróis muito cedo”.
Esquecê-los chega a ser perigoso, disse, porque é o conhecimento da História que permite construir o futuro.
Amílcar Cabral celebraria 100 anos a 12 de setembro de 2024, decorrendo atividades em diferentes países para assinalar a efeméride.
Em Cabo Verde, várias comemorações estão associadas à Fundação Amílcar Cabral, cujo papel Iva Cabral destaca como dinamizadora de um trabalho admirável, que inclui um colóquio internacional sobre o líder histórico, a realizar em setembro, como ponto alto do programa.
A Semana com Lusa
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