Analistas cabo-verdianos ouvidos hoje pela Lusa consideraram que a campanha interna no principal partido da oposição está atingir um nível de conflitualidade verbal e pessoal que é um mau sinal para o PAICV e para a democracia.
Há quatro candidatos à liderança do PAICV “e todos juntos são poucos” para construir um projeto para o país, apontou, ao tentar evidenciar o risco que as tensões implicam: “a única esperança é que surja uma voz aglutinadora”, porque, “se não houver alguém para deitar água na fervura”, o novo líder “pode ter dificuldades enormes para ganhar o país”, em 2026.
“As pessoas estão ávidas por poder e são capazes de fazer coisas de que até Deus duvida”, porque as eleições de 25 de maio para a liderança do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV) vão definir o candidato a primeiro-ministro nas legislativas de 2026, referiu o analista político António Ludgero Correia.
Segundo descreveu, verifica-se “uma violência verbal, (...) perseguição e quebra da paz de espírito que não é aceitável” entre membros do mesmo partido: “como é que querem que mais pessoas se envolvam na política?”, questionou.
O analista apontou como exemplo as trocas de acusações espoletadas pela tentativa de impugnação da lista de Francisco Carvalho, num caso que chegou ao Tribunal Constitucional (cujo acórdão manteve a candidatura) e que considera ter agudizado o clima de “fulanização dos adversários”, visível nas redes sociais.
Há quatro candidatos à liderança do PAICV “e todos juntos são poucos” para construir um projeto para o país, apontou, ao tentar evidenciar o risco que as tensões implicam: “a única esperança é que surja uma voz aglutinadora”, porque, “se não houver alguém para deitar água na fervura”, o novo líder “pode ter dificuldades enormes para ganhar o país”, em 2026.
"[No entanto, o antigo Presidente] Pedro Pires já tem idade e não quer entrar nessas quezílias, José Maria Neves [Presidente da República] não pode, nem deve, entrar nestas questões, Aristides Lima é juiz do Constitucional, e quem sobra? Eu não vejo uma voz no PAICV que possa ser audível, como já foram Pedro Pires ou José Maria Neves”, referiu.
O analista criticou Rui Semedo, atual presidente do partido, considerando que “desapareceu” depois de anunciar, em janeiro, que já não se recandidatava à liderança, quando “teria capacidade para antecipar alguns fenómenos e guiar todos para um comportamento adequado à estatura do partido".
"Acho que ele se demitiu de algumas responsabilidades e deixou um vazio que a ganância e o ego desmesurado de algumas candidaturas acabaram por ocupar”, disse, acrescentando: “A imagem que passa para o país é que, se eles, que já combateram juntos, nas mesmas trincheiras, se mordem e se devoram desta forma entre eles, o que será dos adversários políticos”.
“O partido do Governo [Movimento pela Democracia] tem imensas limitações”, mas “se souber explorar esta falta de comportamento entre irmãos do mesmo partido, isso pode ser muito difícil de ultrapassar pelo PAICV”, referiu António Ludgero Correia.
O analista João de Deus Carvalho disse que, “infelizmente, em Cabo Verde, sempre que há disputa de lideranças internas, surgem clivagens”.
“Falamos muito de democracia, julgamos que são só procedimentos, mas também exige uma cultura democrática profunda”, que não existe e “esse é um problema de todos os partidos em Cabo Verde”, indicou, lamentando que “uma simples disputa de liderança” no PAICV, com o normal confronto de ideias, se transforme “em brigas pessoais”.
“Fulaniza-se tudo” e “isso é muito mau”, disse, considerando ser necessário “discutir ideias, não pessoas”, que podem acabar ostracizadas.
No final, a pacificação pode ser lenta, porque “as discussões são muito emocionais, pouco racionais e geralmente ficam marcas: é preciso ter mais cabeça e menos coração”, recomendou.
No caso concreto, “há muita ansiedade que perturba e cria dificuldades” dentro do PAICV, por causa das eleições legislativas de 2026, referiu.
“Quando os partidos atravessam o deserto, porventura nem há candidatos, mas depois de ganhar as eleições [autárquicas] de 01 de dezembro, surgiram quatro e isso indicia qualquer coisa que não é muito boa”, porque sugere mobilização só quando há poder à vista, considerou.
“Uma coisa boa é quando se acredita num projeto e se luta por ele, mas quando só se mobiliza [alguém] quando o poder parece estar mais perto, cheira mais a oportunismo que outra coisa”, concluiu.
Há quatro candidatos às eleições de 25 de maio no PAICV.
Um deles é Francisco Carvalho, presidente da Câmara da Praia, que apanhou o balanço da vitória reforçada na capital do país para se lançar à conquista do partido, prometendo “Um PAICV para todos, para um Cabo Verde para todos”, lema de campanha.
Nuías Silva, reeleito presidente da Câmara de São Filipe, na ilha do Fogo, foi igualmente uma das caras da vitória nas autárquicas de dezembro e promete “Mais PAICV, por Cabo Verde”.
O deputado pelo círculo da Europa, Francisco Pereira, apresenta-se também ao sufrágio interno, assim como o empresário e presidente da Câmara de Turismo de Cabo Verde, Jorge Spencer Lima – todos com propostas divulgadas nas redes sociais e ligados à diáspora.
A Semana com Lusa
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