domingo, 22 dezembro 2024

Entrevista: Cardeal Dom Arlindo Furtado convida fiéis a fazerem exame de consciência e confissão com a chegada do Natal

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Em entrevista exclusiva ao Asemanonline, o Cardeal Dom Arlindo Furtado fez uma reflexão profunda sobre o Natal, destacando a importância da presença de Cristo como luz nas nossas vidas. O líder religioso da igreja católica em Cabo Verde aconselha a abrir o coração a Cristo, porque se Jesus está no nosso coração, haverá luz, e onde há luz, segundo ele, há respeito, solidariedade e verdadeira humanidade.  

 

Entrevista conduzida por Silvana Gonçalves/Redação 

» A luz de Jesus ilumina a qualidade de ser que nós somos e a qualidade de relação que devemos desenvolver. Quando Jesus está ausente, fica tudo às escuras. Não é por acaso que Jesus disse, “Eu sou a luz do mundo”».   

 

Com mensagens sobre a importância da solidariedade, o Cardeal lembra que aqueles que têm mais, devem partilhar com aqueles que têm menos, por uma questão de solidariedade, praticando a bondade não só na época natalícia. “Deste mundo, nada levamos para o céu. Só levamos as boas obras, e o bem que fizermos, nos acompanha ao céu, diante de Deus”, lembra o Reverendíssimo.

Para este período natalício, o religioso recomenda fazer a celebração penitencial, uma espécie de exame de consciência, de modo a refletir sobre a vida, fazendo um balanço existencial da nossa vida e agradecendo a Deus todas as coisas boas que ao longo do ano conseguiu realizar, com o próprio esforço, com o apoio dos outros, ou com a graça de Deus. 

Recomenda igualmente fazer a reconciliação sacramental—confissão, reconhecendo aquilo que não tem corrido bem, pedindo perdão a Deus,

“Confessemos a Deus as nossas falhas, pedindo perdão e recomeçando de novo, com uma nova frescura, com um novo vigor, com uma nova atitude positiva, preparando-nos para viver com Cristo ao longo do novo ano que vai entrar”.

 

Qual é a principal mensagem que traz este ano para a celebração do Natal aos fiéis?

- O Natal, por si só, é a grande mensagem. O ser humano, a sociedade, que é interpelada a tomar consciência do que significa Natal para os cristãos. Mas o Natal  não é apenas para o cristão, é para a humanidade. O Natal para o cristão é a revelação de Deus, e como a criatura humana, feita à imagem e semelhança de Deus é importante. Porque Deus não só fez o ser humano à sua imagem e semelhança, mas quis fazer-se homem.

Deus nos considera de tal modo que quis assumir a nossa humanidade na pessoa do seu Verbo-Verbo feito carne-Jesus Cristo, fazendo um casamento entre a humanidade e a divindade, de modo que nós agora sabemos bem quem somos e para onde vamos.

Mesmo perante a experiência dolorosa e chocante da morte, Cristo, que assumiu a nossa humanidade, abriu uma porta, de que a morte não tem a última palavra. Afinal, a vida é que terá a última palavra, mesmo na nossa carne, que será revestida de imortalidade como diz São Paulo.

Natal é a assunção da humanidade por parte de Deus, a segunda pessoa da Santíssima Trindade, para nos abrir o caminho para percebermos porque somos chamados assim. Assim como Deus assumiu a nossa humanidade, nós devemos pôr-nos ao nível, para podermos, com a ajuda de Deus, com a graça de Deus, também participar na própria realidade divina.

A pessoa humana é uma criatura muito importante, considerada por Deus, por isso deveremos considerarmos nós mesmos importantes. Nós como pessoas e o próximo que está ao meu lado, que é uma pessoa como nós. Portanto, com esta conceção do ser humano, certamente nós faríamos um esforço suplementar, para termos uma relação de qualidade, de respeito, de amor mútuo, de reciprocidade uns com os outros, porque somos importantes aos olhos de Deus, mas somos importantes a nós próprios. Por isso, como tais, nós devemos nos considerar.

 

Missa solene  e de Galo

 

Quais atividades especiais estão programadas pela igreja para celebrar o Natal?

- Sim, há muitas atividades prévias nas 27 paróquias da Diocese de Santiago.

Todas as paróquias têm uma agenda muito intensa, algumas terão conferências de revelação, outras terão momento de celebração penitencial. De modo a preparar o ambiente e o coração para acolher Jesus, o Emanuel. Deus feito homem, é a pessoa mais importante da nossa vida, portanto, não só preparamos a nossa casa, o nosso ambiente, para termos um ambiente agradável para quem chega, mas, sobretudo preparamos o nosso coração e a nossa vida.

No dia 25 de dezembro, que é o dia que celebramos o nascimento de Jesus Cristo, nós temos a missa do Galo, porque presume-se, e como a Sagrada Escritura nos contextualiza, o nascimento de Jesus à noite. Então, celebramos a chamada missa do Galo, hora que mais ou menos se aproxima do momento em que Cristo terá nascido.

Na Catedral, que é a igreja principal, no Plateau, haverá a missa do Galo, que costuma ser às 22:00 horas, que poderá ser em princípio presidido pelo Bispo. Além da missa do Galo, haverá a missa do dia solene, 25, que é habitualmente transmitida pela televisão nacional (TCV).

Mas haverá outras missas também, para além dessas duas missas principais. E haverá outras celebrações conforme as conveniências e as possibilidades de que cada paróquia dispõe.

 

Reflexão nesta quadra festiva

 

Dom Arlindo propõe aos fiéis refletirem na vida e pedir perdão a Deus, preparando para o novo ano com Cristo

- A celebração penitencial, isto é, ocasião para as pessoas refletirem na sua própria vida. O que é que na minha vida, sobretudo no último ano, não tem ocorrido muito bem? E por quê? O que é que eu preciso melhorar mais? O que é que está bem e que eu devo manter e se possível, até otimizar? É uma espécie de exame de consciência, um balanço de vida, mas ao nível existencial. Porque nós, às vezes, fazemos o balanço em termos de termos mais dinheiro ou menos dinheiro, mais bens, menos bens. Portanto, os bens são importantes, mas são ao serviço da pessoa. Mais importante do que os bens são as pessoas.

Portanto, eu devo ter uma vida de qualidade a partir de dentro, paz interior, coerência comigo mesmo. Falhas, coisas boas que eu devo promover, coisas menos boas que eu devo eliminar ou reduzir, ou então, a minha relação com os outros, como é que está? Este é um exame de consciência para fazer um balanço existencial da nossa vida. Então, fazemos o ato penitencial em que, agradecendo a Deus, todas as coisas boas que ao longo do ano consegui realizar, com o meu esforço, com o apoio dos outros, com a graça de Deus.

E ao mesmo tempo, reconhecendo aquilo que não tem corrido bem, para pedir a Deus perdão, desculpas, o chamado reconciliação sacramental, confissão. Confessamos a Deus as nossas falhas, pedimos perdão e recomeçamos de novo, com uma nova frescura, com um novo vigor, com uma nova atitude positiva, preparando-nos para viver com Cristo ao longo do novo ano que vai entrar.

 

 Ajuda  para os que têm menos

 

 Que mensagem deixa para as pessoas que têm mais recurso, sobre a importância da solidariedade  para com os pobres, sobrtudo nesta época festiva do fim do ano?

- Jesus Cristo manifestou a maior solidariedade, a divindade que se une à nossa humanidade para nos elevar, para nos promover. Ou seja, Cristo é para nós um modelo, por isso que ele disse, “Eu sou o caminho, a verdade e a vida”. Se nós como cristãos, mas antes de mais como seres humanos, a mensagem de Cristo impacta toda a humanidade, todas as dimensões da vida humana. Aprendemos com Deus a sermos solidários uns com os outros. Porque se hoje temos em abundância, não quer dizer que amanhã vamos continuar a ter em abundância. Nós vemos o que acontece, por exemplo, em tantos países, como Moçambique, Síria, Ucrânia. Ou o que aconteceu agora no território ultramarino francês de Mayotte, com o ciclone Chido. Quer dizer, nós de repente podemos perder tudo, mas não podemos perder a humanidade. Por isso que os bens materiais estão ao serviço da humanidade. Por isso, aqueles que têm mais, devem partilhar com aqueles que têm menos. É questão de solidariedade. Não é só agora na época de Natal. Nós devemos ter um coração solidário, um coração fraterno, um coração humano. Ora, todo o coração humano vai ao encontro da humanidade em qualquer circunstância que precisa da nossa ajuda, quer seja material ou humana. Pode precisar de apenas um sorriso, um calor humano, uma conexão. Tudo isso é uma forma de manifestar e partilhar a solidariedade. Não é só em bens materiais, mas sobretudo na qualidade da relação. Porque o ser humano é feito à imagem e semelhança de Deus. Deus é uma comunhão de pessoas. Cristo nos ensinou que Deus é Pai, Filho e Espírito Santo. É uma comunhão de pessoas. Ora, nós seres humanos, se formos feitos à imagem e semelhança de Deus, só seremos realmente humanos e felizes numa boa relação com os outros. Em comunhão com os outros. É uma família fora da família.

Todo o ser humano é digno de solidariedade, de comunhão, de boa relação dos irmãos e das irmãs. Porque nós temos a mesma humanidade. Costumo dizer que todo o sangue é vermelho. Nós temos o mesmo sangue nas veias. Portanto, quer dizer que, para além da cor da pele, das condições sociais, nós somos todos seres humanos. E precisamos uns dos outros para sermos felizes.

Portanto, a solidariedade é sempre uma expressão da humanidade de qualquer pessoa, em qualquer tempo, em qualquer momento, em qualquer lugar, em qualquer circunstância.

Nesta altura de Natal, esse sentido de solidariedade, essa consciência de necessidade de estarmos em comunhão, de partilharmos a vida, vem ao de cima, porque é um tempo forte. Mas é o tempo forte que servirá para alimentar as nossas ações, as nossas atitudes e as nossas atividades ao longo do ano, até se reforçar de novo. Natal é como uma fonte onde vamos beber, fazemos o estoque da humanidade e da solidariedade para vivermos essa realidade ao longo do ano. Depois voltamos ao Natal, para reabastecermos a nossa humanidade e para podermos continuar a ser humanos uns com os outros. Porque com o tempo, se não nos alimentarmos, acabaremos por entrar em situação de debilidade, de fraqueza.

 

Inspiração de Cristo para mais fé, solidariedade e amor hoje em dia

 

Como o nascimento de Jesus Cristo nos inspira a vivermos com mais fé, solidariedade e amor hoje em dia?

- Nós quase tudo que temos de bom também o recebemos. Construímos alguma coisa boa na nossa vida com os alimentos que recebemos. Mas há uma expressão latina que diz ''Nihil novi sub sole'', que significa, “nada de novo debaixo do sol”. Também há uma frase de Lavoisier, que aprendemos, ''No mundo tudo se transforma''. Portanto, o que nós somos, o que nós temos, é toda a transformação daquilo que recebemos e que encontramos. Não criamos nada “ex nihilo”, (do nada em português). Apanhamos alguma coisa e transformamos. Portanto, nós recebemos muita coisa da sociedade, do mundo, da criação, da família, e com o nosso engenho, a nossa boa vontade, a nossa determinação, a nossa ousadia, as nossas capacidades, a nossa boa vontade, transformamos. E aquilo que recebemos, e Deus nos deu a capacidade e a vontade de melhorar, de transformar, de multiplicar, é para quê? Para partilharmos com as outras pessoas, porque deste mundo, nada levamos para o céu. Só levamos as boas obras, o bem que fizermos, nos acompanha ao céu, diante de Deus.

Cristo veio para ser solidário connosco e nos ajudar a crescer espiritualmente. Ele nos ensina a ser solidários de forma fraternal, amigável e generosa, como gostaríamos que os outros fossem connosco. Aliás, ele disse, “Como eu fiz, fazei vós também”. Jesus faz tanta coisa maravilhosa para nós, nós devemos fazer a mesma coisa para os outros. Então, isto tudo constitui a bagagem, o tesouro que enche a nossa vida e que nós apresentaremos a Deus quando partirmos deste mundo, porque nós somos chamados à vida eterna.

 

O líder religioso Arlindo Furtado aconselha» “Abri o vosso coração a Cristo”, pois ele é a luz, sem ele a luz desaparece e dá espaço para as trevas do ódio, da ignorância, do egoísmo»

 

bispo

 

Apelo para paz e concórdia nesta quadra festiva

 

Que apelo faz para promover um clima de paz, principalmente na cidade da Praia, considerando o nível da criminalidade ali existente?

- Se nós repararmos bem, onde é que há mais conflito? Onde é que há mais crimes? Onde é que há mais guerras? Onde é que há mais desumanização? Onde é que há mais falta de respeito pelos direitos humanos? A resposta é, onde falta Jesus, onde falta a luz de Jesus. A luz de Jesus ilumina a qualidade de ser que nós somos e a qualidade de relação que devemos desenvolver. Quando Jesus está ausente, fica tudo às escuras. Não é por acaso que Jesus disse, “Eu sou a luz do mundo”.  Onde Jesus está? Se Jesus está no meu coração, eu percebo rapidamente aquilo que eu devo fazer, aquilo que eu não devo fazer, em quaisquer circunstâncias. Porque se alguém me ofender, se alguém me fazer mal, eu sei até que ponto devo reagir ou a quê ou a quem eu devo recorrer para se restabelecer a justiça. Não vou cometer crime. O crime não compensa. Porque Jesus é assim que agiu e é assim que nos ensinou. Porque deve haver numa sociedade organizada, estruturada, instâncias para repor a justiça. Deve haver e deve funcionar. E quem faz a justiça são as autoridades. Onde está Cristo, luz do mundo, haverá menos falta de respeito pelos direitos humanos. Há mais condições para construir uma relação de fraternidade, de solidariedade, de entreajuda e promoção mútua. Portanto, há mais condições para a qualidade de vida, para a felicidade partilhada.

Mas cada um recebe Jesus se quiser. Não é obrigado. Jesus não obriga. Jesus propõe. Porque Ele sabe que nós somos inteligentes. Que nós temos capacidade de decisão e de escolha. E só tem validade aquela decisão que nós fizermos livremente. Portanto, Cristo não impõe nada. Nem sequer para fazer o bem. Porque é suposto que cada um tenha as condições mínimas para saber escolher o melhor. Escolher o bem. Agora, se o indivíduo faz disparates, então há estruturas sociais de coerção, porque senão a sociedade não funciona.

Quanto mais houver a presença de Cristo na minha vida, na tua vida, na vida dos meus irmãos e das minhas irmãs, de todos, mais condições teremos de ir juntos construir um ambiente humano, uma relação humana feliz e digna.

Quanto mais Cristo for rejeitado, mais facilmente nós entraremos em situações de não entreajuda, não comunhão, não aceitação mútua, não perdão recíproco. E por isso surge os conflitos, as guerras, os crimes.

Por isso, o conselho que deixo, inspirado nas palavras do Papa São João Paulo II, é: “Abri o vosso coração a Cristo”. Cristo não tira nada, só dá coisas boas. Cristo é que nos ajuda a mudar na nossa vida aquilo que não está bem. Devemos abrir cada vez mais o nosso coração a Cristo para ser um agente do bem, uma pessoa do bem, não uma pessoa do mal.

 

Cáritas e associções podem apoiar os mais necessitados

 

Para aqueles que estão passando por dificuldades, solidão, perda ou falta de recursos, qual conselho o Cardeal deixa para os confortarem neste período?

- As Paróquias contam com a Cáritas e com grupos, associações e movimentos que, além de ajudarem neste período, procuram dar cobertura ao longo do ano às pessoas que passam por muitas dificuldades, que vivem na solidão, que não têm familiares, que vivem em situações de muita pobreza.

Há muita entreajuda e solidariedade por aí que circula na nossa sociedade. A Igreja, como sempre, faz as suas coisas de uma forma discreta. Porque quem é ajudado não precisa ser humilhado. Se eu vou ajudar alguém, que precisa, não posso expô-la para o mundo, isto é humilhação, não pode ser. Portanto, agora, cada vez mais aqueles que puderem, sobretudo os cristãos sabem isso, devem ser solidários com os outros. Não só nesta altura de festa, mas que este balanço de solidariedade se prolongue por todo o ano que se aproxima. Que sejam solidários não só em termos de bens, mas em termos de presença, em termos de amizade, em termos daquilo que for necessário para dar qualidade à vida humana. Às vezes é um sorriso, às vezes é uma presença, às vezes é uma salvação, às vezes é um pequeno gesto de presença. Portanto, é isto que nós somos convidados a fazer, de uma forma intensa, agora, nesta altura do Natal, mas ao longo do ano que vai entrar, e ao longo da vida. É a nossa missão.

 

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