O Presidente cabo-verdiano pediu hoje o posicionamento do Tribunal de Contas e da Inspeção Geral das Finanças após a polémica com o salário da primeira-dama, cujas regalias vão ser suspensas.
Segundo a Lusa, a decisão surgiu após uma polémica gerada no país sobre um salário de 300 mil escudos (2.720 euros) da primeira-dama, Débora Carvalho.
A Presidência já tinha emitido um comunicado, afirmando que a primeira dama "nos termos da lei, o mesmo estatuto salarial que tinha no seu quadro de origem, que é o mínimo que se garante a qualquer profissional fora do seu quadro de origem: a manutenção do que já tinha".
Hoje, numa comunicação ao país, o Presidente da República, José Maria Neves, anunciou que vai "solicitar ao Tribunal de Contas e à Inspeção Geral das Finanças o seu pronunciamento sobre a matéria, e designadamente questões de legalidade que possam suscitar-se”.
Conforme explicou, se for entendido que haverá algum montante a repor, “será feito de imediato”.
O chefe de Estado disse que tomou a iniciativa de suspender "imediatamente o processamento dos salários à primeira-dama, o uso de transporte, segurança e outras regalias até que essas matérias sejam definitiva e cabalmente reguladas por lei, na linha de resto do que consta na proposta de nova lei orgânica da Presidência da República” que foi submetida ao Governo.
"Tendo em devida conta a celeuma agora gerada em termo desse assunto, independentemente da forma, do momento, das motivações com que o mesmo foi trazido à opinião pública, entendo que sobre o Presidente da República não pode nem deve pairar dúvidas sobre a lisura com que exerce as suas funções", sustentou a Lusa. Veja a seguir
Comunicado à Nação do Presidente da República
Tenho por necessário dirigir-me à Nação cabo-verdiana nas presentes circunstâncias, sempre fiel ao quadro de diálogo direto que desde sempre, olhos nos olhos, tenho mantido com as cabo-verdianas e os cabo-verdianos.
E começo por recordar e sublinhar o seguinte: durante todo o meu percurso de serviço público, e muito especialmente agora no exercício da mais alta Magistratura da República, tenho-me pautado pelo cumprimento da Constituição, a observância da legalidade e a garantia da transparência nos atos que pratico.
De modo muito inequívoco, nunca, em todos esses anos, procurei ou facilitei benefícios para os meus familiares, designadamente para a minha Mãe, as minhas duas irmãs, a Débora ou para os meus filhos.
É neste contexto que, com toda a serenidade, quero hoje referir-me à questão do salário da Senhora Primeira Dama.
Logo após a minha investidura no cargo de Presidente da República, conversámos sobre a situação da Primeira Dama, Débora Katiza Carvalho, e concluímos que a permanência dela na empresa CV-Móvel seria, desde um ponto de vista ético, incompatível com a sua nova condição e o decorrente volume de compromissos no âmbito de uma agenda social e de representação institucional que queríamos fosse intensa.
Assim antecipávamos e assim de facto tem sido, como, aliás, a sociedade tem podido acompanhar e avaliar. Seria, por conseguinte, mais adequado que o exercício da condição de Primeira Dama acontecesse a tempo inteiro. Seria, enfim, mais benéfico para a Presidência da República e mais leal para com a empresa.
E é por isso que foi formulada a requisição à CV-Móvel e a Senhora Primeira Dama passou a estar na Presidência em regime de licença especial.
Assim, passou a trabalhar no espaço de trabalho da Primeira Dama, espaço esse que já existia e continuou a funcionar no mesmo local e com a mesma designação: ‘Gabinete da Primeira Dama’; passou a contar com o Gabinete de Apoio ao Cônjuge do Presidente da República, criado, desde 2007, pela Lei Orgânica da Presidência da República e que é preenchido com Funcionários destacados da Casa Civil; passou a usufruir de segurança e meios de deslocação, como sempre se garantiu às Primeiras Damas em Cabo Verde, embora isso não esteja estatuído em nenhuma lei. Trata-se de uma prática que se foi consolidando e foi sendo assumida pelo Estado.
Outrossim, passou a auferir remunerações equivalentes às que já tinha no seu quadro de origem, visando não prejudicá-la enquanto cidadã e profissional. É, aliás, esse quadro de proteção que a lei assegura a quem, pelos mecanismos da mobilidade, seja deslocado do seu quadro.
Desde o primeiro momento, desejámos que todos os aspetos atinentes à Primeira Dama fossem clarificados, razão por que fizemos incluir disposições jurídico-administrativas muito claras na proposta de nova Lei Orgânica da Presidência da República que submetemos ao Governo em maio de 2022.
Na mesma linha, e contando que esse diploma fosse aprovado com a brevidade com que foram aprovados os anteriores diplomas relativos à Presidência da República, foi salvaguardado no Orçamento da Presidência da República para o ano de 2023 o necessário respaldo financeiro para o salário e outras implicações financeiras do exercício a tempo inteiro da condição de Primeira Dama. Como se sabe, o Orçamento da Presidência da República é parte integrante do Orçamento do Estado aprovado pelo Parlamento, sendo previamente discutido e arbitrado entre a Presidência da República e o Governo, concretamente o Ministério das Finanças.
Importa clarificar que a Senhora Primeira Dama fez outras deslocações ao estrangeiro, no quadro da sua Fundação Dretu, mas essas deslocações não foram custeadas pelo erário público.
Tendo em devida conta a celeuma agora gerada em torno deste assunto, e independentemente da forma, do momento e das motivações com que o mesmo foi trazido à opinião pública, entendo que sobre o Presidente da República não pode nem deve pairar dúvidas sobre a lisura com que exerce as suas funções, pelo que decidi agir no seguinte sentido e que desejo comunicar à Nação, de forma direta:
- - primeiro, solicitar ao Tribunal de Contas e à Inspeção-Geral das Finanças o seu pronunciamento sobre a matéria, e designadamente questões de legalidade que possam suscitar-se. No termo dessa apreciação, se se entender que haverá algum montante a repor, evidentemente tal será feito de imediato;
- - segundo, e entretanto, suspender imediatamente o processamento dos salários à Senhora Primeira Dama;
- - terceiro, suspender imediatamente o uso de transporte, segurança e outras regalias até que estas matérias sejam definitiva e cabalmente reguladas por lei, na linha, de resto do que consta na proposta de nova Lei Orgânica da Presidência da República que submetemos ao Governo.
Neste ínterim, a Senhora Primeira Dama estará a utilizar a nossa viatura privada e continuará a trabalhar no seu Gabinete no Palácio do Presidente e na sede da Fundação Dretu, defendendo as causas em que sempre acreditou e realizando, com a mesma entrega e sentido de solidariedade, ações em beneficio da sociedade cabo-verdiana em geral.
Muito obrigado
O Presidente da República de Cabo Verde
José Maria Pereira Neves
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