O Tribunal Constitucional (TC) de Cabo Verde acaba de decidir, por maioria dos seus três juizes conselheiros, não declarar a inconstitucionalidade de algumas normas que alteraram o regime jurídico das armas e suas munições. Em causa estava um pedido do Presidente da República que solicitou ao mesmo tribunal a fiscalização sucessiva abstrata da constitucionalidade e legalidade de quatro seguimentos dos artigos 2º e 4º da Lei nº 21/X/2023 que define o regime jurídico das armas e suas munições. Conforme o Acórdão n.º 52/2024, a decisão contou, no entanto, com o voto vencido do Juiz Conselheiro e Presidente do TC, José Pina Delgado, ao considerar que tais normas deviam ter sido declaradas inconstitucionais.
O comunicado remetido ao Asemanonline resumiu que o Tribunal Constitucional deixou o ato legislativo de revisão da Lei das Armas e suas Munições incólume, decidindo não declarar a inconstitucionalidade de normas de incriminação de condutas a envolver brinquedos com formato de arma de fogo, normas de agravação de penas por posse de objetos com capacidade letal ou intimidatória como armas brancas ou peças de vestuário destinadas a ocultar a identidade das pessoas e de definição de critérios de coparticipação.
«Através de uma decisão em que ainda discutiu o tipo de escrutínio que deve usar para sindicar atos legislativos de incriminação de condutas, de fixação de penas e de determinação de causas de agravação, trazendo à baila questões ligadas ao princípio da separação e interdependência entre o poder legislativo e o Tribunal Constitucional», acrescentou o documento.
A mesma instância judicial fundamentou que em causa estava um pedido do Presidente da República que solicitou ao Tribunal Constitucional a fiscalização sucessiva abstrata da constitucionalidade e legalidade de normas insertas nos seguintes preceitos: a) Artigo 2º da Lei nº 21/X/2023 de 16 de maio, que altera o nº 1 do artigo 90º da Lei nº 31/VIII/2013, de 22 de maio, relativa ao regime jurídico das armas e suas munições; b) Artigo 4º da mesma Lei, que adita os artigos 90º-B e 90º-C à Lei nº 31/VIII/2013, de 22 de maio.
Informou que, através do Acórdão n.º 52/2024, de 27 de junho, o TC decidiu, por maioria:
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A) Não declarar a inconstitucionalidade do segmento referente a “reproduções e brinquedos com formato de arma de fogo” da alínea f) do número 1 do artigo 90.º, alterada pelo artigo 2.º da Lei n.º 21/X/2023 de 16 de maio, por não ser incompatível com a Constituição e designadamente o princípio da proporcionalidade ou da proibição do excesso;
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B) Não declarar a inconstitucionalidade do artigo 4º da Lei nº 21/IX/2023, de 16 de maio, na parte em que adita à lei nº 31/VIII/2013, de 22 de maio, o artigo 90.º -B, no segmento em que agrava todos os crimes previstos nas alíneas mencionadas do artigo 90.º, [c), d), e), f) e g)], por efeito de mera posse de gorro, capuz, luvas, lenço, máscara ou qualquer outro meio similar;
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C) Não declarar a inconstitucionalidade do artigo 4.º da Lei nº 21/IX/2023, de 16 de maio, na parte em que adita à Lei nº 31/VIII/2013, de 22 de maio, através do artigo 90.º-B, um segmento que agrava os crimes previstos pelo artigo 90.º, parágrafo primeiro, alíneas c) a g), e parágrafo segundo, no exato sentido de que abarca igualmente as circunstâncias em que o agente não tenha conhecimento da situação que conduz a agravação da pena, por não ser incompatível com a Constituição e designadamente com o princípio da proporcionalidade ou da proibição do excesso;
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D) Não declarar a inconstitucionalidade do artigo 4º da Lei nº 21/IX/2023, de 16 de maio, na parte em que adita à Lei nº 31/VIII/2013, de 22 de maio, o artigo 90.º - C, no segmento em que contempla somente a autoria por participação, nada referindo quanto à autoria singular, por não ser incompatível com a Constituição e designadamente com o princípio da segurança jurídica, enquanto elemento do princípio do Estado de Direito.
Voto vencido do Presidente do TC
Entretanto, conforme consta na declaração anexada ao referido acórdão remetido a este jornal, a decisão contou com o voto vencido do Juiz Conselheiro José Pina Delgado, atual Presidente do TC, na medida em que este magistrado considerou que as quatro normas deviam ter sido declaradas inconstitucionais.
«A primeira por ser incompatível com o princípio da determinabilidade penal e por ser manifestamente desproporcional; A segunda, por agravar ainda mais crimes cometidos por mera posse de brinquedo de arma de fogo em violação do princípio da proporcionalidade; A terceira, por agravar ainda mais crimes cometidos em circunstâncias em que se desconhece que uma pessoa poderá ter na sua posse objeto letal ou intimidatório ou peça de vestuário que permite a ocultação da identidade por desconformidade com o princípio da culpa; e a quarta, por se ter, na sua opinião, construído, uma norma vaga e confusa em detrimento das exigências de precisão decorrentes do princípio da segurança jurídica, ínsito ao princípio do Estado de Direito», sustentou Pina Delgado segundo o comunicado do Tribunal Constitucional remetido a este jornal.
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