No coração do Atlântico, onde o mar desenha histórias e a brisa murmureja lendas, repousam as ilhas de Cabo Verde. É um arquipélago de contrastes e mistérios, onde a poesia de pre-claridosos como José Lopes e Pedro Cardoso ressoa no tempo, trazendo consigo a fascinante ideia de que Cabo Verde é afinal muito mais do que um conjunto de ilhas - é sim um pedaço sobrevivente da lendária Atlântida submergida.
Caminhando pelas ruas de D’jarFogo, onde a morna embala sonhos e a coladeira celebra a vida, pode-se sentir a alma de uma civilização antiga pulsando sob os pés. Os legados do nosso Poeta maior, Pedro Cardoso, autenticamente,
"pisamos... talvez a mesma terra que os Atlantes,"
sugerem que nos os cabo-verdianos de hoje podemos estar caminhando sobre os mesmos caminhos que outrora foram percorridos pelos atlantes. Esta ideia romântica e poderosa revela uma nova alfombra de identidade única, misturando o passado mítico com o presente incompreendido. Prossegue o nosso poeta maior:
A minha pátria, tudo o que resta da misteriosa Atlântida, é uma montanha olímpica
Tamanha! (…)
Na verdade, escutai! – chama-se
Fogo!
Nasci na Ilha do Fogo,
Sou, pois, Caboverdeano,
E disso tanto me ufano
Que por nada dera tal.
Ser filho de Cabo Verde,
Assevero – fronte erguida –
Que me é honra a mais subida
Ser neto de Portugal.
José Lopes, em seus versos, encontrados em Alfarrábios e em Almanaques Luso-Brasileiros de Lembranças na biblioteca de S. Nicolau onde estudou, associa Cabo Verde a Mito Hesperitano da Atlántida submergida,
"vastas extensões assim submersas" e como "ficaram estas nossas ilhas",
evocando imagens de uma grande calamidade que deu origem às ilhas de Cabo Verde. Esta narrativa poética não é apenas uma metáfora para as transformações geológicas e históricas, mas também um símbolo da resiliência e adaptação do nosso povo cabo-verdiano. Nos, como os míticos sobreviventes de Atlântida, enfrentamos adversidades, evoluímos e prosperamos.
A nossa identidade, portanto, é um mosaico complexo. Por um lado, há uma rica herança africana e europeia, mas muito mais europeia do que africana, (pois somos todos netos de Portugal) como muito bem concluiu o nosso Antropólogo, doutor Brito Semedo no seu mais recente artigo publicado no Santiago Magazine, herança essa visível na música, na dança, na gastronomia e nos rostos sorridentes das pessoas. Por outro lado, há essa conexão mística com Atlântida, com a Pasárgada, inclusive ate’ com o grande mito do jardim das Hespérides, onde poetas escreviam sonetos com pomos de ouro e lagrimas de saudades. Tudo isso nos confere uma sensação de pertencimento a algo antigo, muito antigo, misterioso e grandioso. Maior que Africa e Europa. Essa dualidade enriquece a nossa cultura, tornando-a única no mundo.
As nossas ilhas são meros fragmentos de um continente tragado pelo mar, um passado esquecido, emergindo do oceano para contar nossas histórias. Cada praia, cada montanha, cada vale da nossa terra parece ecoar com ecos de uma civilização perdida, mas não esquecida. Nos os cabo-verdianos, com a nossa hospitalidade, nossa música e nossa alegria de viver, somos os guardiões modernos dessa herança, moldando-a e reinterpretando-a à luz de nossas experiências contemporâneas.
Assim, quando se fala da real identidade dos cabo-verdianos, fala-se de uma civilização criada com fios de história, mito, cultura e espírito indomável. Se a nossa Terra é de fato um remanescente de Atlântida ou não, não deve ser uma questão para poetas e sonhadores, tao somente. O que é inegável, no entanto, é que o arquipélago e o nosso povo são um exemplo vívido de como a história, a mitologia e a identidade podem se confundir, criando algo verdadeiramente mágico e inesquecível. E em solidariedade com Pedro Cardoso e José Lopes termino, recitando também.
Antes de ser de Cabo Verde, Filho do sol,
Era do reino afundado, um triste farol.
Das Hespérides vim, na tristeza a estremecer,
Versos que na alma do mundo vêm a nascer.
Djuze’ Derriba, na escuridão, um nome a soar,
Atlante, poeta, no vazio do mar a vagar.
Na imensidão das ilhas, na solidão a errar,
Minha alma busca paz, mas apenas encontra o vulcão e o mar.
Djuze’ D’erriba. JANUARY USA.
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