A escassez de recursos naturais e as poucas vantagens comparativas de Cabo Verde no competitivo processo da globalização obrigam a investimentos estratégicos na Educação para converter o capital humano em capital socioeconómico e cultural porque as Taxas de Analfabetismo e de Universitários Diplomados têm dificultado a aceleração do processo de desenvolvimento iniciado com a Independência, cuja relação de diferença com os países mais desenvolvidos considero de grau e não de natureza, assumindo que os desníveis existentes relativamente a esses países prendem-se mais com diferenças a nível das situações políticas, sociais, económicas e culturais, do que a nível da mentalidade profunda.
Por: Adrião Simões Ferreira da Cunha*
No passado dia 22 foi publicado o meu Artigo Amílcar Cabral e a Língua Portuguesa que foi objeto de comentários de 11 leitores que muito agradeço e que me suscitaram a vontade de publicar este Artigo.
"Mehr LichtI"-"Mais Luz": Últimas palavras de Göethe ao morrer pedindo que abrissem a janela do quarto para entrar mais luz e que são interpretadas como significando "Mais instrução, mais saber". Johann Wolfgang von Göethe (1749-1832) foi um escritor alemão e pensador que também fez incursões pelo campo da ciência, tendo sido uma das mais importantes figuras da Literatura Alemã e do Romantismo Europeu.
Abordo neste artigo alguns aspetos da matriz social de Cabo Verde, em que pesaram algumas marcas da leitura dos livros Tours d´Horizont de Jacques Attali, e Os Novos Poderes de Alvin Toffler.
Os órgãos de comunicação social Caboverdianos, de acordo com a sua linha editorial, publicam por vezes artigos que abordam alguns aspetos positivos e negativos da realidade Caboverdiana, mas, tanto quanto posso saber, não dão o devido relevo às Taxas de Analfabetismo e de Universitários Diplomados enquanto fatores determinantes do processo de desenvolvimento de Cabo Verde.
A Taxa de Analfabetismo exprime a percentagem da população que não sabe ler nem escrever sobre a população com 15 e mais anos, e a Taxa de Universitários Diplomados exprime a percentagem da população possuidora de um curso superior universitário sobre a população com 25 e mais anos.
A Taxa de Analfabetismo de Cabo Verde tem tido a seguinte evolução: 63% em 1975 [data da Independência], 48,8% em 1980, 37,2% em 1990, 25,2% em 2000, 17,2% em 2010, e 12,3% em 2018, sendo notória a sua redução progressiva e, sobretudo, ser já só 1,5% para a população com idades entre os 15 e 24 anos, traduzindo o sucesso dos investimentos públicos efetuados na Educação para combater o Analfabetismo.
Contudo, impõe-se refletir sobre qual seria a Taxa de Analfabetismo se o conceito integrasse, além dos indivíduos que não sabem ler e escrever, os que sabendo ler e escrever, não sabem interpretar um texto corrente e efetuar um cálculo mesmo que simples, o que traduz o conceito de Analfabetismo Funcional.
A Taxa de Universitários Diplomados tem tido a seguinte evolução: 1,6% em 1990, 2,4% em 2000, 7,6% em 2010, e 8,5% em 2018, indiciando o surgimento progressivo de mais elites políticas, económicas, sociais e culturais que são fundamentais para acelerar ainda mais o processo do desenvolvimento.
Penso ser consensual que o Analfabetismo é um dos fatores que dificulta a capacitação para acelerar o processo de desenvolvimento face às mutações a que o País está sujeito, agora mais que nunca pela mundialização dos problemas e, sobretudo, das respetivas soluções, cuja análise não pode centrar-se sobre aspetos parcelares e sem relevar a diferença dos conceitos de desenvolvimento e crescimento, já de si de extremas algo difusas.
O desenvolvimento exprime o nível de qualidade de vida da população, medindo-se pelo grau de satisfação das suas necessidades básicas e secundárias [rendimento, habitação, saúde, educação, lazer], de forma a melhorar o seu bem-estar, enquanto o crescimento exprime a riqueza produzida por um país, correspondendo ao aumento da riqueza resultante da produção de bens e serviços, podendo não haver grande preocupação na forma como está distribuída pela população.
A escassez de recursos naturais e as poucas vantagens comparativas de Cabo Verde no competitivo processo da globalização obrigam a investimentos estratégicos na Educação para converter o capital humano em capital socioeconómico e cultural porque as Taxas de Analfabetismo e de Universitários Diplomados têm dificultado a aceleração do processo de desenvolvimento iniciado com a Independência, cuja relação de diferença com os países mais desenvolvidos considero de grau e não de natureza, assumindo que os desníveis existentes relativamente a esses países prendem-se mais com diferenças a nível das situações políticas, sociais, económicas e culturais, do que a nível da mentalidade profunda.
De facto, a Educação é um atributo da Sociedade para que contribuem de forma permanente a cultura, as tradições, os valores do povo, e as políticas públicas para atender às necessidades do desenvolvimento e às expectativas de realização pessoal e profissional de cada cidadão, sendo um catalisador e portanto um fator determinante do desenvolvimento, enquanto principal ferramenta para capacitar capital humano qualificado necessário, uma vez que sem qualificação é impossível a um país competir nesta "Era do Conhecimento".
Assim, Educação e Sociedade estão indissoluvelmente ligadas, condicionando-se mutuamente, em que o ritmo de evolução de uma determina o ritmo de evolução da outra, sendo a Educação o mecanismo privilegiado para afirmar e preservar a identidade nacional, transmitir valores éticos e cívicos, e formar os recursos humanos para enfrentar o desafio do desenvolvimento.
Em geral as pessoas sabem que os homens se distinguem dos outros animais pela sua capacidade de raciocínio, mas não que há uma diferença entre os próprios homens, ou seja, entre os que têm a capacidade de raciocínio em termos de futuro [abstração-conceção ideal-antecipação] e os que a não têm.
A capacidade de raciocínio em termos de futuro exige a posse de muita e variada informação sobre o "mundo" [local, regional, nacional e internacional], numa perspetiva do passado como do presente, capacitadora de exercícios de análise, síntese e prospetiva, que permitem uma atitude crítica sobre o presente e consequente atuação visando a delimitação dos contornos possíveis para construir um futuro coletivo melhor.
A incapacidade de assimilar informação, ou seja, receber, refletir, conservar e saber orientar-se no labirinto de informação que cada vez mais está disponível, impede a formação de opinião e, consequentemente, a assunção de atitude, ou seja, de participação, só se podendo participar quando se tem voz sempre que se tem vez, sendo que nas Sociedades abertas, como é a de Cabo Verde, ter vez é possível de se procurar e encontrar para expressar a voz, tendo presente o poder da palavra sobre a palavra do poder.
Convém ter presente que a informação segundo é veiculada pela imprensa, rádio ou televisão, impõe aos indivíduos a posse de diferentes requisitos para a assimilar, em que a televisão remove em parte o obstáculo do analfabetismo na medida em que, não exigindo uma audiência adestrada, isto é, que os destinatários saibam ler e escrever pelo menos, é potencialmente apreensível por todos: iletrados e instruídos, mas suprime o mecanismo da reflexão e, como tal, é redutora da racionalidade na produção de efeitos na opinião e no comportamento dos indivíduos e dos grupos que integram a Sociedade.
Nas Sociedades democráticas a Educação toma o indivíduo como referência fulcral, procurando transmitir-lhe a memória, valores, conhecimentos e saberes do seu tempo, mas procura também ensiná-lo a aprender e sobretudo "aprender a ser", o que implica também a aquisição do sentido da solidariedade e da cidadania, sendo um fator fundamental de desenvolvimento, como meio de emancipação plena do ser humano, com vista à sua libertação das forças opressoras, sejam elas de natureza física, biológica, social, económica, ou cultural, que comprometem ou limitam o seu bem-estar e a sua felicidade.
A melhoria das Taxas de Analfabetismo e de Universitários Diplomados de Cabo Verde é determinante para acelerar o processo de desenvolvimento, verificando-se que a informação apresentada a seguir mostra que o País está numa boa posição relativamente aos outros Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa e a Timor-Leste:
Taxa de Analfabetismo (ordem decrescente): Moçambique 49,9%, Guiné-Bissau 45,8%, Timor-Leste 34,5%, Angola 34,4%, Cabo Verde 12,3%, São Tomé e Príncipe 9,9%, Brasil 9,1%, Portugal 5,2%.
Taxa de Universitários Diplomados (ordem crescente): Angola 0,1%, Moçambique 0,4%, Guiné-Bissau 1,1%, São Tomé e Príncipe 3,1%, Timor-Leste 5,2%, Cabo Verde 7,6%, Brasil 11,3%, Portugal 15,9%.
Já dizia o poeta popular português António Aleixo na 1ª metade do século XX: "Não sou esperto nem bruto, nem bem nem mal educado. Sou simplesmente o produto do meio em que fui criado", o que consubstancia que o homem é, sobretudo, o resultado da sua circunstância, entendida como um conjunto complexo de informações, normas, valores, comportamentos e realizações materiais que diferenciam as sociedades humanas e que atuam sobre cada indivíduo levando-o a adotar uma estrutura de valores pessoais que lhe permite conjugar atitudes de pertença e diferenciação relativamente à comunidade de referência da sua circunstância.
Havendo vários períodos de formação ao longo da vida de cada indivíduo, existe uma capacidade de atuar no domínio da circunstância através de forças de partilha e troca de informações que se situam no exterior da família e da escola, as quais, embora cimentadas numa herança cultural comum, deverão atuar no respeito pelo valor da diversidade enquanto elemento capacitador do florescimento do pensamento divergente suscetível de proporcionar o desenvolvimento permanente da circunstância que propicia o desenvolvimento do próprio Homem.
Na verdade, o pensamento divergente é um valor fundamental das sociedades democráticas caracterizadas pela capacidade de lidar com conflitos, e preocupadas com a procura do rigor, numa dimensão cultural alargada onde, a par da defesa dos valores de cultura própria, se procura o diálogo entre as expressões políticas, culturais, económicas e sociais diferenciadas, embora o conflito possa ter um sentido pejorativo, como algo que devesse ser evitado, mas divergir é inerente às sociedades democráticas que respeitam o pensamento divergente, isto é, os múltiplos discursos, sendo o conflito resolvido pela discussão e confronto de opiniões.
Assim, no respeito deste valor, a melhoria da formação educacional e cultural da população Caboverdiana é sem dúvida a orientação estratégica que mais poderá diminuir resistências ao desenvolvimento, na medida em que permite aos cidadãos compreender melhor os processos em causa, assim como lhes alarga o leque de possibilidades de intervenção na Sociedade, tendo presente que nas sociedades democráticas os cidadãos participam nas decisões políticas sendo ao mesmo tempo sujeitos delas.
Este esforço é determinante para criar a massa crítica indispensável à formação das futuras elites dirigentes capazes de produzir racionalidade e orientação para a evolução da Sociedade, tendo presente que o processo do desenvolvimento, por estar sujeito à internacionalização é muito rápido, pelo que esse esforço só terá o sucesso desejado com o contributo dos que estão nos patamares educacionais e culturais mais elevados, logo as elites políticas, sociais, económicas e culturais, apelando aos valores mais sublimes da sua cidadania.
As Elites Caboverdianas, além da substância da sua preparação e da sua competência técnica, para o serem verdadeiramente, têm de cumprir diariamente deveres que abarcam valores, atitudes e padrões de comportamento, ou seja, trata-se de ética, e o seu sucesso na vida política, na vida académica, nas profissões liberais, na gestão de entidades públicas e privadas, tem de ancorar aqui, partir daqui e retornar sempre aqui, em que a cultura é um fator determinante para o exercício da cidadania.
Cidadania é o conjunto de direitos e deveres a que um indivíduo está sujeito na Sociedade em que vive, cujo conceito esteve sempre muito ligado à noção de direitos, especialmente os direitos políticos, que permitem ao indivíduo intervir na direção dos negócios públicos do Estado, participando direta ou indiretamente na formação do Governo, sendo um direito de se ter uma ideia e poder expressá-la livremente.
Ninguém nasce cidadão, mas torna-se cidadão pela educação, que atualiza a inclinação potencial e natural dos homens para a vida comunitária ou social. A cidadania é o direito de ter uma ideia e poder expressá-la livremente, de poder votar em quem quiser, sendo nesse sentido um processo.
A história das civilizações mostra que a cidadania representa uma etapa do desenvolvimento humano e o resultado da modificação dos hábitos culturais dos homens. Por isso, parte-se de uma perspetiva de análise dos fatores históricos, por meio da leitura e interpretação dos textos constitucionais para conhecer a problemática que se coloca nos dias hodiernos, e ver a má qualidade da educação como o principal problema enfrentado por muitos países pode parecer muito óbvio, mas nem sempre se consegue identificá-lo, muito menos compreendê-lo.
É importante compreender o que é Cultura para saber como podemos adquiri-la, sendo um conceito usado de forma genérica para falar de valores e práticas humanas ou de conhecimento e experiências adquiridas sendo o conceito mais corrente o conjunto de conhecimentos, crenças, arte, moral, lei, costumes e os outros hábitos e capacidades adquiridos pelo homem como membro da Sociedade.
Por ter sido muito associada ao conceito de Civilização no século XVIII, a Cultura muitas vezes confunde-se com desenvolvimento, educação, bons costumes, etiqueta e comportamentos de elite, confusão que foi comum nos séculos XVIII e XIX, onde Cultura se referia a um ideal de elite, que possibilitou surgir a hierarquização entre cultura erudita e cultura popular, ainda presente no imaginário das Sociedades Ocidentais.
A leitura é crucial para a aprendizagem do ser humano, pois é através dela que podemos enriquecer o nosso conhecimento e contribuir para que essa chamada Cultura possa crescer na nossa mente.
As tecnologias da informação e comunicação do mundo moderno, infelizmente, fizeram com que as pessoas deixassem a leitura de lado, originando jovens cada vez mais desinteressados dos livros, possuindo vocabulários cada vez mais pobres e conhecimentos muito escassos no dia-a-dia.
É preciso ter um cuidado que é não deixar que as novas tecnologias nos tornem nuns analfabetos funcionais, que lemos informação muito tempo em redes sociais e nos mais variados sites, mas não conseguimos compreender as informações que nos chegam tornando-nos pessoas cansadas mentalmente e sem conteúdo cultural.
Nós que todos os dias usamos a Língua Portuguesa nem sempre temos presente que é a 4ª Língua mais falada no Mundo, sendo a Língua Oficial de Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe, e Timor-Leste, e uma das línguas oficiais da Guiné Equatorial e de Macau, sendo Língua Oficial na União Europeia, na União Africana, nas Organizações Ibero-Americanas, e nas Agências e Organismos da Nações Unidas, num total de 32 Organizações Internacionais.
Se houver um paraíso espero que tenha uma biblioteca e com livros em Língua Portuguesa, considerando muito a seguinte afirmação de Blaise Pascal (físico, matemático, filósofo e teólogo Francês, 1623-1662) Uma vez que não podemos ser universais e saber tudo quanto se pode saber acerca de tudo, é preciso saber-se um pouco de tudo, pois é muito melhor saber-se alguma coisa de tudo do que saber-se tudo apenas de uma coisa.
A leitura é algo crucial para a aprendizagem do ser humano, pois é através dela que podemos enriquecer o nosso vocabulário, obter conhecimento, dinamizar o raciocínio e a interpretação. Muitas pessoas dizem não ter paciência para ler um livro, no entanto isso acontece por falta de hábito, pois se a leitura fosse um hábito rotineiro as pessoas saberiam apreciar uma boa obra literária, por exemplo.
Muitas coisas que aprendemos na escola são esquecidas com o tempo pois não as praticamos, mas através da leitura rotineira tais conhecimentos se fixariam de forma a não serem esquecidos posteriormente. Dúvidas que temos ao escrever poderiam ser sanadas pelo hábito de ler, talvez nem as teríamos pois a leitura torna nosso conhecimento mais amplo e diversificado.
O hábito de ler deve ser estimulado na infância, para que o indivíduo aprenda desde pequeno que ler é algo importante e prazeroso, assim com certeza ele será um adulto culto, dinâmico deve haver alguns direitos do leitor, como o de escolher o que quer ler, o de reler, o de ler em qualquer lugar, ou, até mesmo, o de não ler.
Lisboa,24 de Outubro de 2019
*Estaticista Oficial Aposentado - Antigo Vice-Presidente do Instituto Nacional de Estatística de Portugal
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