O director-geral das Comunidades afirmou este sábado, que a saída dos jovens cabo-verdianos para o estrangeiro não deve ser encarada como um “problema”, mas sim como “direito legitimo” e uma realidade que faz parte da historia do país.
“A saída de jovens não é um problema e Cabo Verde foi sempre um país de emigração” disse em declarações à imprensa, à margem do Fórum “Emigração Juvenil – Emigração Cabo-Verdiana: Desafios e Oportunidades”, realizada hoje na Universidade de Santiago (US) na cidade Praia, pela Geração B-Bright.
“Enquanto Estado livre e democrático, não podemos proibir ninguém de sair. As pessoas têm o direito de escolher onde querem realizar as suas vidas”, acrescentou.
Segundo disse, os jovens saem do país sobretudo por motivos de estudo ou para procurar melhores condições de vida, o que considera ser “legítimo que os jovens procurem melhores condições de vida”, sublinhando que são livres para escolher o caminho que querem seguir.
O mesmo realçou ainda, que o Governo de Cabo Verde tem implementado várias políticas públicas para garantir oportunidades aos jovens que permanecem no país, destacando a existência de centros de formação profissional que já formaram milhares de jovens para o mercado de trabalho, preparando-os para enfrentarem os desafios do desenvolvimento nacional.
No entanto, reconheceu que mesmo com esses esforços, muitos jovens continuam a optar por emigrar.
“Jovens de Cabo Verde saem legitimamente para procurar melhores condições de vida assim como os jovens de Portugal saem para a América, à procura de melhores condições de vida. Isto nunca foi um problema e Cabo Verde tem de tirar da cabeça que é um problema os jovens saírem”, sublinhou.
Além disso, sublinhou a importância do retorno dos emigrantes para o desenvolvimento do país, seja através do conhecimento adquirido, das experiências vividas ou dos investimentos financeiros que fazem em Cabo Verde.
“O retorno dos nossos jovens é fundamental para o crescimento económico e social do país. É um retorno que traz valor e contribui para a construção de uma nação mais forte”, afirmou.
Por fim, o responsável lembrou ainda que Cabo Verde é também um país de imigração, acolhendo cidadãos de diversos países africanos que participam activamente na vida económica e social do arquipélago.
“O mundo é dinâmico e a nossa realidade reflecte isso. Assim como muitos dos nossos jovens procuram oportunidades fora, também recebemos pessoas que ajudam a suprir necessidades no mercado de trabalho e contribuem para o nosso desenvolvimento”, reiterou.
Martinho Ramos concluiu afirmando que, apesar dos desafios, o foco deve estar na criação de condições cada vez melhores para todos os jovens cabo-verdianos, seja dentro ou fora do país, para que possam realizar os seus sonhos e contribuir para o futuro de Cabo Verde.
A Semana com Inforpress
Direito de Partir ou Vergonha de Ficar? — Quando a Fuga dos Jovens Deixa de Ser Liberdade e Passa a Ser Sintoma
Li as declarações do Director-Geral das Comunidades e juro que tive de reler para ter a certeza de que não era piada. Segundo ele, a saída em massa de jovens cabo-verdianos para o estrangeiro “não é um problema, é um direito legítimo”.Sim. Leste bem. O país está a esvaziar-se de juventude, de talento, de força de trabalho e de esperança — mas está tudo bem, porque é um direito.
A sério, o senhor vive em que realidade? Cabo Verde está a formar jovens para exportar, a capacitar para alimentar estatísticas de remessas. E isto é normal? Isto é aceitável? Isto é motivo de tranquilidade?
Comparar com a emigração portuguesa do século XIX é de uma ignorância perigosa. Nessa altura, as pessoas fugiam da miséria absoluta, sem Estado, sem apoio, sem nada. Hoje, em teoria, temos instituições, temos uma república, temos planos estratégicos a cada cinco anos. Mas pelos vistos temos também uma elite política que se habituou tanto ao falhanço que já o baptiza de “direito”.
Sim, emigrar é um direito. Mas fugir do país porque não se encontra emprego, porque não há oportunidades, porque se nasce num bairro onde não se chega a nada — isso é sinal de colapso, não de liberdade. Só não vê quem não quer… ou quem nunca passou por isso.
E mais: é fácil dizer que não é problema quando se tem um cargo pago pelo Estado, um salário fixo e viagens para conferências. Para quem vê os filhos a irem embora sem saber quando voltam, para quem se despede no aeroporto com lágrimas nos olhos e coração apertado — isso não é "direito", isso é dor disfarçada de opção.
Basta de discursos frios, técnicos e desumanos. A emigração em massa da juventude cabo-verdiana é um sintoma gravíssimo de um país que falhou. Que continua a falhar. E que, em vez de enfrentar a realidade, prefere assobiar para o lado e chamar-lhe “legítimo”.
Mas um dia, não haverá mais jovens para partir. E nesse dia, talvez — só talvez — os senhores no poder percebam que o verdadeiro problema não é a emigração…
…é a vontade de ficar que deixaram morrer.
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