Wednesday, 02 July 2025

A ATUALIDADE

Independências: “Incerteza” paira sobre a emigração, mas salário fala mais alto - sociólogo

Star InactiveStar InactiveStar InactiveStar InactiveStar Inactive
 

 “Incerteza” é a palavra dominante na análise do sociólogo cabo-verdiano Nardi Sousa sobre o futuro da emigração, um movimento que faz parte da identidade do arquipélago e em que a atração salarial do exterior ainda fala mais alto.

 

“O problema são outras dimensões da vida, sentirem-se estrangeiros”, com um “discurso racista e xenófobo”, que tem vindo “a aumentar” ao mesmo tempo que a política de controlo migratório ganha força na agenda política, ou seja, erguem-se barreiras.“Mas a Europa também precisa de mão-de-obra” no seio da sua população envelhecida, pelo que, segundo Nardi Sousa, a “incerteza” que paira sobre o futuro da emigração só se resolverá “com diálogo”.“No âmbito da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) vai haver sempre diálogo”, acredita, defendendo políticas com visão no tempo.

 

 

“O mundo está a mudar”, refere, em entrevista à Lusa, a propósito dos 50 anos de independência do país e da evolução do fenómeno migratório.

A guerra após a invasão russa da Ucrânia e os conflitos no Médio Oriente são dois dos principais sinais das mudanças geopolíticas com implicações na economia e políticas migratórias.

Se a instabilidade continuar, pode potenciar um desencanto e um eventual “retorno a África”, defendeu.

Para já, o rendimento fala mais alto: “a atração maior é o salário”, um jovem “ganha 200 euros em Cabo Verde e a três horas e meia vai ganhar 800, em Portugal. Há muitos casos de estudantes que são dependentes aqui e são provedores lá”, passando a enviar remessas para ajudar a sustentar a família.

“O problema são outras dimensões da vida, sentirem-se estrangeiros”, com um “discurso racista e xenófobo”, que tem vindo “a aumentar” ao mesmo tempo que a política de controlo migratório ganha força na agenda política, ou seja, erguem-se barreiras.

“Mas a Europa também precisa de mão-de-obra” no seio da sua população envelhecida, pelo que, segundo Nardi Sousa, a “incerteza” que paira sobre o futuro da emigração só se resolverá “com diálogo”.

“No âmbito da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) vai haver sempre diálogo”, acredita, defendendo políticas com visão no tempo.

“Há ciclos” tanto a nível político como social, e é preciso diálogo para gerir as estratégias “a médio e longo prazo”, evitando decisões de curto prazo que “podem fechar portas ao outro no futuro”, por exemplo, quando um ciclo político num bloco ou país mudar.

Na história da emigração ao longo dos seus 50 anos de independência, Cabo Verde tem beneficiado, desde 2010, da Parceria Especial com a União Europeia (UE) e dos acordos de mobilidade dentro da CPLP.

É certo que o direito à emigração “está na Constituição” cabo-verdiana, até porque sempre foi preciso gerir os parcos recursos que o país pode garantir à sua população e ter receitas do exterior, indica Nardi Sousa.

“Mas, ultimamente, sentimos que a saída de jovens é excessiva”, diz, apontando para as queixas de falta de mão-de-obra em setores como construção e especialidades, hotelaria, agricultura e pescas.

“A taxa de natalidade em Cabo Verde diminuiu muito. Ainda é de 2,4 [por mulher], mas a tendência é para diminuir de forma acelerada e temos de gerir a nossa política populacional com atenção: hoje temos um bónus demográfico, mas daqui a 20 anos podemos ter um problema sério”, alerta.

Para convencer os cabo-verdianos a ficar, as políticas internas devem focar-se em resolver aquilo que, nas suas intervenções públicas, o sociólogo tem designado de “cidadania adiada”. 

“Há muita gente que materialmente não se vê realizada em Cabo Verde”, com um salário mínimo equivalente a 150 ou 170 euros e salário médio na casa dos 500 euros: “há pessoas que querem ter mais rendimentos, uma habitação ou médico” e encontram esses privilégios de cidadania no exterior.

Ao mesmo tempo, imigrantes oriundos sobretudo do continente africano (Guiné-Bissau, Senegal e Nigéria), mas também portugueses, procuram oportunidades em Cabo Verde e ajudam a colmatar o espaço deixado vago na economia por quem parte.

“Em 2010, tínhamos 14.000 imigrantes, em 2017 havia muitas obras” e o número subiu para 17.000 e hoje o Governo admite a necessidade de acolher imigrantes da Comunidade Económica e de Desenvolvimento da África Ocidental (CEDEAO). 

Neste movimento natural entre mercados abertos, num mundo com maior mobilidade, Nardi Sousa diz que seria importante “reduzir discriminações” para quem chega a Cabo Verde, nomeadamente ao nível de contratos de trabalho.

A independência foi feita há 50 anos com “uma energia própria” de quem estava “a construir algo novo”.

“Essa energia dissipou-se”, com o desgaste de políticas e promessas falhadas, segundo a análise de Nardi Sousa.

“Temos de fazer mudanças estruturais, levar as pessoas a acreditar que, se confiarmos, conseguiremos criar países dignos para viver, em vez de estarmos na pele do emigrante rejeitado”, concluiu.

 

A Semana com Lusa

2500 Characters left


Colunistas

Opiniões e Feedback

lucas
5 days 9 hours

Vamos falar claro. Violência sexual contra crianças não é um problema invisível. Está à vista de todos — e está a ...

jcf
5 days 15 hours

Se quer mesmo estudar a história africana, Elsa, aqui vai a bibliografia que deveria ter lido antes de escrever esse panflet ...

jcf
5 days 15 hours

Ó digníssima articulista, Elsa Fontes — quanta verborreia embalsamada em citações dos velhos profetas de Coimbra e Lisb ...

Pub-reportagem

publireport

Rua Vila do Maio, Palmarejo Praia
Email: asemana.cv@gmail.com
asemanacv.comercial@gmail.com
Telefones: +238 3533944 / 9727634/ 993 28 23
Contacte - nos