Thursday, 19 June 2025

E ECONOMIA

Independência/50 Anos: Música cabo-verdiana, da repressão à internacionalização dos géneros tradicionais

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A música cabo-verdiana sempre interagiu com os processos políticos e sociais, espelhando o percurso da história do arquipélago desde o período colonial à internacionalização dos géneros, conforme realçou o investigador, Carlos Gonçalves.

 

 

Entretanto,  Gonçalves sublinhou que desde o século XIX existiam composições com cariz crítico e cita como exemplo a morna “Sodade de São Nicolau” dos anos 50, que denunciava de forma subtil o envio forçado de trabalhadores cabo-verdianos para São Tomé.

 

 

Na perspectiva do jornalista e investigador da área, Carlos Gonçalves, antes da independência existia em Cabo Verde “a música” (morna e coladeira) reconhecidas como géneros nacionais, e “não música” (batuco e a tabanca) manifestações reprimidas pelo regime colonial.

“Durante o período colonial existia um conceito de cultura nos moldes da cultura portuguesa. As manifestações culturais descendentes da cultura africana eram consideradas uma cultura inferior, portanto uma não cultura, logo, uma cultura a ser pura e simplesmente eliminada”, explicou.

Para se fazer o batuco em Santiago era às escondidas como forma de escapar à perseguição policial.

A partir dos anos 60 surgem então, conforme o investigador, músicas de protesto, que denunciavam, não directamente, situações vividas na época, porque seriam censuradas.

“Então, qualquer música para ser gravada e apresentada num espetáculo tinha que passar pela censura e ter o visto”, esclareceu.

Entretanto, Carlos Gonçalves sublinhou que desde o século XIX existiam composições com cariz crítico e cita como exemplo a morna “Sodade de São Nicolau” dos anos 50, que denunciava de forma subtil o envio forçado de trabalhadores cabo-verdianos para São Tomé.

No fundo, trata-se, segundo decifrou, de uma música implícita e crítica ao envio de contratados cabo-verdianos para São Tomé e Príncipe, fugindo da fome que alastrava o arquipélago, porque não viam outra solução senão ir trabalhar nas roças de São Tomé.

Com o 25 de Abril em 1974 em Portugal houve, conforme Gonçalves, um verdadeiro “sismo” na música de Cabo Verde.

“Ou seja, toda a música anterior que falava de "cretcheu" ou então sobre críticas à mulher, tudo isto ficou “obsoleto” e passou a ser o moderno e o actual, a música com letras relativas a independência ou crítica ao regime colonial”, disse.

Depois do 25 de Abril a “não música” emerge e todos os géneros musicais, a morna e coladeira, o batuco, o funaná, as mazurcas, as músicas típicas do Fogo e da Brava surgem então em força, contou.

Segundo Gonçalves, surgem também em Portugal e em Cabo Verde, grupos que dão corpo à nova fase da música nacional nomeadamente Os Tubarões, Opus Set, Kings, Batuco Jazz e muitos outros.

E Lisboa transforma-se no novo centro de gravação e edição discográfica, substituindo Holanda, até então referência com nomes como Djunga de Biluca e Bana na produção.

A partir de 1975, a “não música” ou seja o batuco e o funaná, que aparece numa fase em que o batuco era muito perseguido, deixam de ser manifestações proibidas para se tornarem símbolos da identidade nacional.

“Nos anos 90, durante o processo de transição para o multipartidarismo, a música volta a desempenhar um papel político. Batuco e funaná são recuperados em comícios políticos, desta vez com mensagens adaptadas à nova realidade democrática. A música reflecte novamente o tempo em que se vive, como o fizera em 1975”, informou.

Num momento em que o funaná vivia o seu auge, com grupos como Zeca e Zezé de Nha Reinalda a conquistar o sucesso local e europeu, Carlos Gonçalves salientou que surgiu Cesária Évora a relançar a morna num novo patamar internacional.

Hoje, volvidos 50 anos da independência, a música tradicional cabo-verdiana continua bem viva, cantada e reinventada por novas gerações.

As batucadeiras Nha Balila, 95 anos e Nha Marina Vaz, 87 anos, são testemunhas de personalidades ligadas à resistência da música tradicional, tendo revelado o gosto pelo batuco desde muito cedo quando acompanhavam as suas mães e outras pessoas mais velhas nessas andanças.

Apesar de ter nascido com problemas de visão e não ter sido aceita na escola, Nha Balila diz que aprendeu a sentir a música com o coração, para quem o batuco tem um significado profundo na sua vida, afirmando que debaixo de Deus é o seu batuco.

Nha Marina é integrante do grupo "Nos Herança", com 36 anos de existência, e expressa a alegria e prazer que sente ao cantar e dançar o batuco, outrora realizado nos momentos especiais como casamento e baptizado.

Esta batucadeira mais antiga em acção reconhece a importância do batuco como uma tradição que se espalhou por todo o país e na diáspora, que hoje, tem a missão de formar as novas gerações para preservar essa cultura.

Por seu lado, Zeca di Nha Reinalda destacou o papel fundamental dos grupos musicais, como Finason e Bulimundo na promoção das mudanças políticas no país.

O artista atribui aos músicos um papel “fundamental” nas transformações políticas através de críticas social e política expressas por meio das músicas, e cita como exemplo a música “Democracia” de 1981, que, segundo o mesmo, contribuiu para abrir os olhos de muitas pessoas para a mudança política.

Silva do grupo Bulimundo, surgido em 1978, lembrou que durante o período colonial a morna e a coladeira eram os géneros musicais mais valorizados, enquanto os estilos de características africanas, como o batuco e o funaná, especialmente na ilha de Santiago, foram confinados devido a preconceitos racial e cultural.

Segundo afirmou, Bulimundo foi o pioneiro na introdução de instrumentos eletrónicos no funaná, o que tornou o género mais popular, sendo que as letras abordavam temas sociais e políticos promovendo valores de nacionalismo e patriotismo.

 

A Semana com Inforpress

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Terra
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Ninguem perguntava a um homem se ele tinha mérito de ser na uma linha partidário/ Hahaha tchakota boca calado tem resposta ...

Maika
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Não fosse o apoio do imperialismo americano desta vez seria varrido da face da terra os genocidas e criminosos sanguinários ...

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Nhos vota na MPD tamebe Naty fla ma ainda nos codja nada?

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